Hoje vi uma coisa que mexeu um pouco comigo. Não me perguntem de que forma, porque eu próprio não sei bem explicar. Sei apenas que aquela simples visão me trouxe de “volta á Terra” quando, segundos antes, voava a quilómetros de altura na tentativa de me distanciar de alguns pensamentos e preocupações que me assolavam o pensamento. Horas depois daquela cena, ainda não encontro explicação para aquele sentimento, para aquele “bom sentimento” ainda por descrever. De alguma estranha maneira, aquela imagem, na sua crua simplicidade, devolveu-me a paz de espírito de que já andava a reclamar desde manhã bem cedo.
Aconteceu de tarde. Foi num vermelho de um semáforo, e não demorou mais que um minuto. Foi tempo mais que suficiente. Quatro carros á minha frente e na linha continua que dividia a minha faixa com a outra do lado esquerdo, estava ela. Era uma jovem indiana entre os dezoito e os vinte. Estava ali para pedir. Até aí tudo normal, pensei eu, e foi precisamente aí, na indiferença a que infelizmente me habituei a quem pede esmola na rua, que fui “surpreendido”: Enquanto os condutores, eu inclusive, aguardavam impacientemente pela autorização do verde para avançarem, eis que esta bonita indiana bem vestida á tradição do seu país começa, e para minha enorme surpresa, a fazer malabarismo com cinco objectos no ar! Para meu espanto, e mesmo á distância, vi que eles eram atirados alto e com a destreza de uma profissional de circo...Que maravilha! E que bem que eu estava ali a assistir ao "seu momento", ao seu escasso e repetitivo minuto de trabalho honesto para quem o quisesse ver. Ali estava ela, de certeza já a horas a fio, a lutar pelo reconhecimento de um estranho, sem a venda na cara, sem exigências, sem chantagem emocional, apenas com um chapéu ao pé para quem quisesse á passagem dizer o seu "obrigado"... e fazia-o com um enorme sorriso, com enorme prazer, tudo por ela, pela provável moedinha sem valor que eu trazia no bolso esquecido da calça…
Acreditem... foi um "momento".
"Agora que descrevo esta cena, não me parece que deva ter pena desta mulher, como depois pensei que deveria ter. Tenho, isso sim, admiração, respeito e, acreditem ou não, alguma inveja, pois todos nós somos "malabaristas" do circo da vida mas, claro, nem sempre com orgulho..."