terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Vozes da Rádio


Interrompidas apenas pela música e pelo anúncio publicitário, estão sempre ali, presentes, constantes, teimando em nos ocupar os ouvidos com os seus monólogos e perguntas retóricas, entretendo-nos com piadas, passatempos, prémios e discussões acaloradas. Ao longo dos intermináveis km´s de estrada que me conduzem aos habituais destinos da instalada rotina, elas, as vozes, são forçosamente a minha única companhia, amizades já seladas por anos de convivio mas ainda sem cara, ocupantes nos lugares vazios e que sem cerimónia e entrave me tratam por tu. As vozes. Graves, profundas, agudas, estridentes, alegres, preocupadas, irritadas, serenas, teimam em falar comigo como se um passageiro sentado ao lado fossem. A rádio.
Enquanto da beira da estrada as muitas tabuletas de “Bem-vindo a…” e de “Volte sempre a…” me acenam adeuses, essas vozes desprovidas de corpo vão alternando com frequência, um problema de frequência aposto, passam a ruídos de fundo. Com o tempo e a distância, dou por mim hipnotizado. Não o sei, mas estou. Agora não ouço, não vejo, não sinto. Tudo é automático, até o cigarro na ponta dos dedos. O caminho passa a ser uma longa recta de alcatrão sem curvas e contra curvas a curvar. Sou conduzido pelo carro, embalado pela cacofonia das estações que se atropelam a cada cinquenta metros. É o meu corpo que está atento e não eu, sim porque “Eu” estou a voar, a deixar-me levar pelo vento…
Correndo o risco de se questionarem se eu me encontro de plenas capacidades mentais, não posso deixar de considerar algumas hipóteses: Nunca vos passou pela cabeça que, durante esse periodo de "adormecimento de sentidos" muitas dessas vozes de palavras isoladas, algumas delas arrastando-se por frases gastas e monocórdicas, estão de alguma estranha forma a falar directamente com o nosso inconsciente, com a nossa alma, dando-nos respostas e formas de pensar sobre assuntos e questões muito concretas da nossa própria vida? Já se questionaram se, de forma a nos ajudar a obter soluções para os mais variados problemas que habitam no nosso corpo, eles, os nossos guias e mentores espirituais, não recorrem a outra frequência, manipulando uma outra via, para que nós, simples e limitados corpos terrenos, possamos escutar e assimilar mesmo sem estarmos de facto a ouvir essas… vozes da rádio?

4 comentários:

FM disse...

(risos)
Abraço.

Hélder Ferrão disse...

(risos)
Abraço, Francisco

FM disse...

E por falar em vozes, a minha, 15 dias depois, voltou às ondas hertzianas. (sorrisos)
Abraço.

Hélder Ferrão disse...

(sorrisos) Uma voz que quando mesmo ausente nos diz sempre algo de importante, essa a tua...
Obrigado.
Abraço, Francisco